quarta-feira, 7 de novembro de 2012

AUTARCAS DE BARRO


AUTARCAS DE BARRO

Ligo a TV, se não está vai logo de seguida para um canal de notícias, qualquer um serve. Se não gosto da qualidade jornalística, do tipo entrevistar pessoas na rua e ver como está o tempo na Serra da Estrela ou na Costa da Caparica, mudo automaticamente de canal. Mas a peça jornalística que estou prestes a descrever e a comentar, tem algo surreal, uma espécie de arte, que me fez aguentar sem vomitar e assistir até ao final.
A base da notícia em si, nem sequer é notícia, é apenas informação, algo que se repete e repete todos os dias. Fala-se, correm rumores de que mais uma empresa a laborar em Portugal vai fechar as portas e sofrer uma deslocalização da actividade produtiva para outro país, ao que tudo indica, para a Tunísia.
Trata-se de uma empresa de capital Alemão a laborar no concelho de Oleiros e que emprega cerca de 100 pessoas. No meio da reportagem, entre os habituais dramas e queixumes que vão do «eu trabalho aqui desde o principio» ou do «eu trabalho aqui há 20 anos» ou do «trabalho aqui mais o meu marido», até ao fatídico e invariavelmente conformado «o que é que vamos fazer agora, porque aqui neste concelho não há mais nada?», no meio da reportagem dizia eu, e falando em concelho, é inevitável a presença perante as cameras de reportagem da figurinha do presidente da Câmara, todo engomadinho, e penteadinho, até parece que o estou a ver há 30 anos atrás, antes de a politica fazer dele o que é hoje, a desmontar da sua Sachs V5, a puxá-la para cima do descanso, a coçar os tomates, a puxar do pente do bolso de trás das calças, a fazer aquele ar de pessoa importante e a declarar estas preciosidades da oratória politico-governativa:
-É inadmissível isto que está aqui a acontecer, esta empresa não pode fechar, o terreno é da Câmara ( deveria querer dizer dos Munícipes), e não paga renda há mais de 20 anos, só pagam a agua e a luz, vou fazer pressão sobre o ministro da economia, e aproveitar a vinda da Senhora Merkel a Portugal para que ele (o Ministro) a pressione ( a Merkel) no sentido de não fechar a empresa. Eles dizem que a querem levar para a Tunísia, mas nós vamos nos unir e de dentro desta fábrica não sai uma única máquina.
Depois para fazer tempo voltam a entrevistar mais uns trabalhadores que voltam a dizer o mesmo, e voltam a entrevistar o Presidente da Câmara que volta a dizer basicamente o mesmo, e é aqui que o jornalismo começa a perder qualidade e eu mudo de canal.
Hoje de manhã acordo, e vem-me á memoria esta extraordinária história, sobre a qual estive a reflectir nos últimos momentos.
Ao assistir a este tipo de cenas, compreende-se cada vez melhor porque este país chegou ao ponto que chegou.
Primeiro: se não há alternativas em questão de mercado de trabalho no concelho, isso também é responsabilidade do presidente da Câmara, ou não? Não me parece que seja culpa da Senhora Merkel.
Segundo: A falta de estratégia e de visão destes autarcas (e há por aí centenas deles), é tanta que até dá vontade de rir. Meu caro senhor, para se fazer ou exercer pressão sobre algo ou alguém, é preciso ter alguma força ou trunfo do nosso lado, chama-se a isso, capacidade negocial, temos de ter algo que os outros querem e consideram importante, e temos de evitar o mais possível estar dependente no que quer que seja da outra parte. O que é que o senhor tem para dar ao Ministro da Economia e á Senhora Merkel? Um concelho devastado por incêndios que o senhor ou quem o antecedeu não conseguiu proteger, e um concelho que em termos de industria e a economia se resume a um investimento estrangeiro, que cria 100 postos de trabalho, baseado em baixa qualificação dos trabalhadores e consequente mão de obra barata, ao qual não há alternativas. Em resumo, esse concelho é bem o espelho e reflexo da dimensão da sua incompetência.
Terceiro: Impedir que as máquinas saiam, não vai resolver nada claro, se há coisa que os alemães fazem em quantidade e qualidade é máquinas, e levá-las da Alemanha para a Tunísia ou de Portugal, em termos de custos globais de Transporte não fará grande diferença, e se aí ficares com elas, como não tens inteligência para mais, o mais provável é que elas enferrujem e apodreçam.
Quarto: O senhor deve pensar que a chefe do governo alemão não tem mais que fazer e com que se preocupar. Tem noção do que é a Alemanha enquanto país, economia e Povo em toda a sua dimensão? Tem noção de quantas empresas como essa e maiores que essa existem na Alemanha? Tem noção que também na Alemanha todos os dias fecham e se deslocalizam empresas como essa e maiores? Tem noção que essa empresa quando aí se foi instalar no seu concelho, já veio deslocalizada de outro lado? Realmente estou mesmo a ver a Senhora Merkel Preocupada com o seu problema e a ser vítima de pressão da sua parte por causa disso.
Quinto: Terreno e renda á borla? Acho isso muito louvável e uma óptima medida para atrair investimento. Mas, também acho, que isso não deveria ser um beneficio exclusivo de uma empresa estrangeira, como também de todas as pequenas e medias empresas e jovens portugueses, que muitas vezes se querem lançar num projecto empresarial e que vêm todos os caminhos tapados e bloqueados á sua frente por causa de incompetentes e burocratas corruptos como o senhor, que passaram o tempo a gastar o dinheiro dos contribuintes alemães a construir rotundas ajardinadas, fontes de agua, calçada, cinemas, polidesportivos, jardins, empregos e contratos de obra para os amigos, e quando esses jovens querem um terreno para montar o seu negocio, têm de o fazer na garagem ou no quintal das traseiras porque não existem zonas industriais e artesanais e devidamente equipadas de infraestruturas para o efeito, porque o terreno que têm não está no PDM, ou porque simplesmente não têm dinheiro para subornar o Excelentíssimo Presidente da Câmara Municipal e respectivos vereadores a fim de estes fazerem uma conveniente alteração ao PDM entre as 23.00H de Hoje e as 08.00 H de amanhã.
Sexto: Compreendo perfeitamente que o Senhor tenha umas eleições para ganhar dentro de menos de um ano, mas insistir neste discurso e nesta politica demagoga, do populismo barato é chão que já deu uvas, até porque os contribuintes alemães já começam a ficar cansados disso, é que eles também têm problemas na terra deles que querem ver resolvidos, e os contribuintes Portugueses também já começam a ficar fartos de encher o cuzinho e a barriguinha destes autarcas cuja única preocupação é completar o numero de mandatos necessários para garantir a reforma vitalícia, assim como a promoção dentro dos órgãos do partido, visando alcançar tachos de maior diâmetro e recheados de comidinha muito melhor condimentada. Mas o senhor, também não é o único culpado, é que os munícipes que continuam a votar em si e a aplaudi-lo, são os mesmos que não dão conta que passados 20 anos de subsídios europeus para desenvolver e modernizar o país estruturalmente, temos uma estrutura que inunda a cada 3 pingos de chuva, que tomba a cada 2 rajadas de vento, que desmorona a cada noite de lua cheia e que cada vez mais suja se encontra. É que tanto dinheiro depois, uma parte significativa deste Povo continua sem acesso a redes de saneamento básico que funcionem, e em que grande parte dos esgotos das nossas Aldeias, Vilas e Cidades, continua a escoar livremente para os rios, lagoas, albufeiras, para o mar e subsolo.
Mas não deixa de ser curioso que nem o senhor nem nenhum dos seus ilustres colegas de profissão perca tempo para explicar o porquê de tal situação perante as cameras de televisão exibindo o fatinho e a gravatinha tão bem engomadinhas.
Até aqui têm-nos dado música, mas daqui para a frente é que vamos ver quem são os autarcas com dedos para tocar viola.

Nota de Autor: O Autor quer deixar bem claro que no texto acima escrito, não existem qualquer tipo de insultos ou acusações seja de que ordem for, a quem quer que seja. O Autor colocou algumas das vezes numa única personagem aquilo que pensa de toda uma classe de pessoas. Por isso, o que existe em grande quantidade e talvez não tão grande qualidade, são figuras de estilo literário, uma vez que sendo baseado numa história verídica, a história aqui relatada pode ser ou não uma puta de uma coincidência com a realidade que cada um, de qualquer um de nós pode ou não conhecer, pode ou não ter alguma vez vivido, ou presenciado.
Se por acaso, algum autarca deste país se sentir melindrado, ofendido, ou enfiar a carapuça de alguma coisa que aqui tenha sido dito, quero declarar o seguinte:
Primeiro: não tenho qualquer intenção de pedir desculpa, pelo menos para já, deixando no entanto bem claro que não confundo o todo pela parte.
Segundo: A César o que é de César. E á mulher de César não basta ser de César, é preciso parece-lo. Os contribuintes têm feito a sua parte, até bem de mais. Se pagam os seus impostos a tempo e a horas são contribuintes sérios e honestos. Os políticos, se querem que os comecem a considerar pessoas de bem, sérias e honestas, então tratem de mostrar resultado dessa mesma seriedade e honestidade. 

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