Salvam o serviço de saúde impedindo o tratamento de doenças não covid.
Salvam a economia fechando as empresas.
Somente para mentes inquietas e sexualmente activas
Salvam o serviço de saúde impedindo o tratamento de doenças não covid.
Salvam a economia fechando as empresas.
-Américo, é preciso matar coelhos.
-Quantos?
-Sei lá, os machos já andam à bulha uns com os outros, é preciso matar aquilo para não empranharem as fêmeas, depois não se podem matar e não tenho onde pôr tanto coelho.
Lá vou eu. Entro na coelheira, abro a porta da gaiola, estendo a mão. São fáceis de agarrar. Com o medo juntam-se todos num canto em cima uns dos outros. lanço a mão a um, agarro-o pelas duas patas traseiras, com a outra mão estico as orelhas, um murro no cachaço, o corpo contrai-se, à medida que se descontrai o corpo o sangue vai saindo pelas orelhas. Largo-o no chão, esperneia, uns mais que outros, quando o rabo se levantar sai o mijo e morre nesse instante.
Entretanto meti a mão dentro, agarrei outro, o processo repete-se em rotina. Um, depois outro, e outro, e outro, até ao ultimo. no fim, resta uma terreirada de coelhos mortos em cima da palha.
Agora começa o fastidioso processo de esfolar. O gancho já está pendurado na oliveira, fica lá de umas vezes para as outras.
Tirada
a pele, é preciso limpar as tripas. Com ambas as mãos abrem-se as
pernas para trás até o osso estalar, a faca abre em cima na pélvis,
dois dedos entram dentro da barriga e o bico da faca entra entre os
dedos e abre a fina pele da barriga até ao externo. Dois dedos
limpam por trás da tripa do intestino grosso e da bexiga e limpam
tudo até abaixo. É preciso tirar a goela bem agarrada com um puxão
forte mas seguro para não rebentar, caso contrario sai merda por
todo lado. Abre-se a caixa torácica , puxa-se o fígado e retira-se
com muito cuidado o fel, ou bílis. Verifica-se se há manchas
brancas no fígado. Se houver não é aconselhável comer o animal,
pode ter doença grave. Falta só cortar as pontas das patas, a que
está segura pelo gancho é a ultima. Se houver algum pelo retira-se depois da carne arrefecer. Se se derramar o fel, lava-se
com agua abundante ou joga-se o fígado fora. Demorei 10 minutos a
escrever isto, todo o processo não demora mais de três.
Isto faz
de mim um insensível assassino em série. O acto de matar coelhos
numa capoeira não
pode ser comparado com uma caçada ou montaria ou
pode? Animais aprisionados e indefesos, mortos de forma automática e
mecânica sem rezas ou sentimentos. A rotina insensível de retirar a
vida a um ser sem capacidade de defesa.
Porcos, borregos, cabritos
só difere no tamanho, a anatomia é quase igual. Já as aves
dispenso. Trabalho fastidioso o de retirar penas e de entranhas
infinitamente muito mais mal cheirosas.
As saudades que tenho de
um coelho lentamente refugado num tacho de barro, em cima de uma
trempe por cima de um lume de lenha de oliveira. Uma batatinha
cozida, um feijão verde ou uns grelos escaldados ao dente com azeite
e alho e molho do tacho. Vinho no jarro, do pipo de madeira vindo da
adega fresca.
Assassino me confesso. Podeis comer merda, os cães
também a comem e andam gordos.
Fodei-vos.
Pertenço à geração do Carpe Diem. A geração que viu o filme «o clube dos poetas mortos» interpretado pelo genial Robin Williams, enquanto andava no liceu.
E de repente, toda a gente queria aproveitar o dia, toda a gente queria aproveitar a vida, toda a gente parecia não estar preocupada com o futuro desde que vivesse o presente, ninguém mais parecia preocupado com os preconceitos sociais, culturais e religiosos desde que se fosse feliz. A busca e concretização da felicidade tornou-se no todo e no tudo do tão pouco que era a vida desta gente. Aproveita o dia. Carpe Diem. Foi como uma epifania, uma libertação, um soltar das amarras, e de um momento para o outro todos éramos livres de voar sem limites desde que se aproveitasse o dia.
É claro que nem tudo foi assim tão belo e que o futuro de muita desta gente não foi assim tão promissor e banhado de felicidade. Como tudo na vida, não há bem que sempre dure e mal que não acabe. Mas lá foram lutando ao som do mote: Carpe Diem.
Há três coisas para as quais qualquer ser vivo está programado à nascença: sobreviver, reproduzir e morrer. A morte é a única das três que temos como certa e inevitável e contraria sempre as outras duas. Se a morte está certa, porque raio despendemos de tanto esforço e energia para a contrariar desde o primeiro momento de vida? A pergunta parece óbvia para nós, mas não para qualquer outro ser vivo. É possível que sejamos o único ser à face da terra que temos noção do que é a morte e da sua inevitabilidade. Geneticamente e antes do reconhecimento da auto-consciência estamos programados para perpetuar os genes e a vida. Para isso precisamos de sobreviver, de lutar pela vida. A luta pela sobrevivência é constante e brutal e apresenta riscos a toda a hora e a todo o momento. O risco da morte. Passamos a vida a lutar contra o inevitável. Parece um contrassenso. Somos vigaristas tentando ludibriar a morte em cada momento da nossa vida, em cada batida do nosso coração. Pelo menos temos conseguido prolongar o tempo médio de vida. Eu diria que estamos a jogar melhor mas inevitavelmente continuamos a perder o jogo.
A reprodução é também uma forma de ludibriar a morte. Na impossibilidade da nossa matéria viver para sempre, renovamos a vida pela reprodução passando os nossos genes de geração em geração rumo à vida eterna.
Ou então, por outro lado, qualquer ser vivo tendo uma real consciência da sua efemeridade e, sabendo do carácter de escassez que representa a morte para a vida, torne esta tão valiosa, o que leva a que se lute por ela como um bem valioso que é. Talvez nasça aqui o conceito de propriedade privada. O nosso bem mais valioso: a Vida, que é só nossa, a nossa propriedade que nos pode ser retirada, a qual podemos retirar a nós próprios se deixar-mos de lhe atribuir valor. Mas é tão nossa, que nem mesmo depois de roubada alguém se pode apropriar dela. É nossa e só nossa. Uma propriedade, pessoal, privada, da qual apenas nos é permitido doar uma cópia, mas nunca o original. É assim uma doença sexualmente transmissível sem cura.
É por este sonho de imortalidade que corremos riscos, lutamos, enfrentamos a toda poderosa morte, e morremos sem morrer. Tal como o salmão que morre para não morrer.
Hoje, é com tristeza que vejo pessoas que prometeram aproveitar o dia e viver, a refugiarem-se da vida com medo de morrer. Perdemos a motivação para viver e esse é o primeiro sintoma da morte. Perdemos o sentido da vida. Não lhe atribuímos mais valor. É uma propriedade que já não nos pertence. Foi-nos sonegada, nacionalizada. Somos seres semi-vivos que vivemos sem viver e morremos sem morrer.
No filme acima mencionado, entre muitas, há outra lição, ou outra frase motivadora: «não quero chegar ao fim da vida e descobrir que não vivi». Sabemos que perderemos a guerra, mas em cada batalha lutaremos para continuar a viver sabendo que só perdemos a guerra na última batalha em que lutamos.
Precisamos assim de um novo filme, que nos motive e nos traga de volta o gosto pela vida, a adrenalina do risco e do perigo, a emoção e conforto de sobreviver a mais um dia, e cada dia como uma nova provação como se fosse a última.
Num outro filme, Denis Quaid na personagem de Jerry Lee Lews dizia: « I may go to hell, but I go playing the Piano».
As pessoas comentam futebol como se aquela merda fosse matemática. Mais engraçado se pensarmos que depois do nono ano quase todos abandonam a dita.
Eu, sou camionista. Se percebesse de futebol seria treinador.
Em relação à bola, salvo raras excepções, limito os meus comentários à sabedoria que guardo acerca de vinhos: se sabe bem é bom, se sabe mal não presta.
Nunca consegui distinguir a merda dos taninos, muito menos as frutas vermelhas ou tão pouco as negras maduras. As bordas de cereja são um completo mistério, os sulfitos ou os aromas da maresia também. As especiarias nunca as encontrei, fossem marcadas ou subtis. Já a presença forte, nunca me deu para o encorpado. É sempre para a fraqueza nas pernas. A presença marcante, essa, só a encontro em copos cheios e acalcados. O amarelo-palha num vinho não me faz salivar – eu sei o que é palha e é coisa que não aprecio, muito menos no vinho – reflexos esverdeados ou rubis, passam-me ao lado que sou daltónico, e os aromas frutados de notas cítricas e florais fazem-me chorar pela estupidez do meu palato. Se o paladar for acídulo não lhe chamo vinho mas vinagre – não me parece boa propaganda para vender um vinho, mas eles lá sabem – já o final de boca deixa-me sempre a nostalgia do fim do orgasmo quando é bom e o alívio para a zurrapa.
«De cor vermelha e bordas violáceas, este vinho apresenta aroma de groselha e ameixas maduras com notas de chocolate. O paladar é de corpo médio, com bom volume em boca e taninos redondos, acompanhado de notas de cerejas negras. »
Nem
a formação do Universo ou o sentido da vida me apresenta tantos
mistérios como a quantidade de merdas que esta gente consegue
encontrar num golo de vinho. Sou mesmo uma boçalidade.
LOL! Taninos redondos é muito bom.
Agarrem na coisa e substituam vinho por chocolate, um bife, batatas, filetes de anchova, feijões ou grelos. Ou cona.
«de cor vermelha e bordas violáceas, esta cona apresenta aroma de groselha e ameixas maduras com notas de chocolate. O paladar é de corpo médio, com bom volume em boca (imaginem no pénis) e taninos redondos, acompanhada de notas de cerejas negras.»
Da mesma forma, nunca vi a defesa em quadrado ou o ataque em losango. Quanto à táctica confundo sempre o 4 3 3 com o 453,o 442 o 5321, o 334 ou o 2345. Só sei que são 11 mas só conseguem somar até 10 - por alguma razão deixaram os estudos para jogar à bola. Foras de jogo e faltas de intensidade relativa na bissetriz do retângulo da área ou do triângulo atacante, esquece. É muito complicado. No entanto sou fascinado pela força da técnica assim como pela técnica da força, e não consigo encontrar um filho da puta que me explique porque é que os jornalistas e comentadores insistem em substituir a quadragésima sétima internacionalização pela internacionalização quarenta e sete – lá está, talvez por terem deixado de estudar matemática no primeiro ciclo preparatório e também o português. Jogar em profundidade entre linhas com as linhas subidas a condicionar a pressão na saída para o contra ataque com a pressão dos alas na linha de ataque à entrada do segundo avançado no apoio ao segundo falso ponta de lança cheira-me a vinho marado. São somente 22 gajos atrás da bola e ás vezes marcam uns golos que vale bem a pena ver.
E o que me fode mesmo é andarem ali a trocar a bola dez minutos para trás e para a frente para depois a perder num passe desajeitado ou deixarem-na roubar dos pés por um adversário que se fartou de o ver ali parado a degustar frisantes do Vale do Tejo. Deixam-me o final da boca quadrado com aromas de cebola podre, paladar de batas estragadas e taninos de ovos ovais passados do prazo.
Nunca gostei de trabalhar para aquecer, mas já a beber dou-lhe um jeito .
-Oh Pacheco, é branco oun tinto?
- Cheio e acalcado.
Não faço ideia, mas suspeito que fiquei contente no fim do dia.
A
25 de Novembro de 1975 tinha 22 meses, 21 e meio vá. Não me posso
lembrar, apesar de já andar mas ainda não ser tão refilão como
hoje.
No
princípio de Outubro de 75, eu, os meus irmãos a minha mãe e a minha avó,
deixámos para trás a guerra em Angola. Depois de uns meses a fugir
dos morteiros, obuses, rajadas de G3 e snipers em cima do mamoeiro,
saímos de Nova Lisboa ainda em 74, ruma a cerca de um ano em
Mossâmedes. Depois a fuga para a África do Sul, um campo de
refugiados, o regresso a Mossâmedes, o êxodo para Luanda e
finalmente a ponte aérea para Lisboa.
O
caos no aeroporto e as primeiras semanas em casa de familiares numa
aldeia perdida algures na Serra dos Candeeiros.
O
meu Pai e o meu Tio tinham ficado para trás. Agarrados à esperança.
Sempre a esperança de não perder o fruto de décadas de trabalho
árduo. A esperança do fim da guerra, de salvar o pouco que restava
e de poder voltar à nossa vida, à nossa casa, à nossa terra, ao
nosso país, que isto aqui não nos pertencia. Isto não era a nossa
terra. Nada aqui se identificava connosco.
A
10 de Novembro, o meu pai foi um dos últimos a embarcar num navio de
carga ucraniano ancorado na baía de Luanda, por debaixo do caos.
Celebrava-se já a independência do dia seguinte por entre tiros de
combate que se misturavam com os dos festejos. Pena que aos
embarcados não restassem motivos para festa.
Alguns
dias num barco ucraniano, rumo a Lisboa, sob propostas e lavagem
cerebral para rumar à união soviética onde ofereciam estudos,
amanhãs que cantavam e estatuto social e político no regresso à
futura República popular democrática de Portugal. Alguns foram.
O meu Pai não. O que já tinha visto em Angola de 18 meses de
tentativa de implantação de um regime marxista já lhe tinha
chegado.
O barco entrou na Barra do Tejo ao fim do dia 24 de Novembro de 1975. O desembarque fez-se durante a manhã do dia 25 de Novembro.
Saiu de Luanda debaixo da chuva de artilharia e barricadas de revoltados marxistas cubanos, para pôr pé no cais de Alcântara de uma Lisboa em estado de sítio ocupada pelas forças revolucionárias marxistas do COPCON e do PCP.
Primeiro pensamento: «Guerra por guerra mais vale voltar para trás.»
Entre táxis e boleias, lá chegou à pequena casa, na pequena Aldeia perdida na pequena Serra de um país minúsculo onde o esperava no meio das incertezas a família da qual não havia notícias há dois meses. A família que há dois meses não sabia se era morto ou vivo.
É certo que não me lembro desse dia, mas certamente que houve alegria no final desse 25 de Novembro, de 1975, à lareira na pequena casa, da pequena Aldeia perdida na pequena Serra, de um país minúsculo.